Da série "Livros que mudaram a minha vida"
Um desconhecido certo dia me perguntou por que O Lobo do Mar, do escritor americano Jack London, mudou a minha vida. E como adoro falar de livros, resolvi responder aqui.
O romance é narrado em primeira pessoa por Humphrey Van Weyden, um dândi californiano de finais do século XIX, que sobrevive ao naufrágio do ferry boat no qual viajava e é resgatado por uma escuna foqueira chamada Ghost, capitaneada por Lobo Larsen, um homem que desconhece qualquer compromisso que não seja consigo mesmo, um lúcifer miltoniano, como o narrador o descreveria mais tarde. Van Weyden está cheio de concepções grandiloquentes e edificantes sobre o mundo e o homem, e vê todas elas serem esmagadas pela sua própria experiência como prisioneiro semi-escravizado, pelos fatos que presencia na embarcação e nas conversas com Lobo Larsen, que se revela, surpreendentemente, um homem culto e inteligente, o que o torna ainda mais malévolo e ao mesmo tempo intrigante aos olhos de Humphrey.
Lobo Larsen destrói com elegância e objetividade qualquer veleidade de grandeza sentimental ou moral. Não pude resistir a várias leituras, e cada vez que chegava à última página ele me convencia mais e mais de que um mundo tão selvagem e injusto não pode existir um Deus benevolente que queira o bem de todos e possa intervir no transcurso dos acontecimentos. Se Deus quer e pode acabar com o sofrimento, por que então o sofrimento existe? Se ele quer e não pode, então não pode interferir em qualquer evento. Se pode, mas não quer, trata-se de uma divindade malévola. E se nem pode, nem quer, por que diabos chamá-lo de Deus?
Em meados de 2001, sete meses após a primeira leitura, admiti que era um descrente. E sabia que devia creditar a Lobo Larsen o papel de fator desencadeador de toda essa que foi, de longe, a mudança mais substancial da minha vida. Deixei de me torturar e me preocupar com o que um ser onipotente e oniperfeito estaria pensando de mim. Pela primeira vez na vida me sentia completamente livre: meu principal compromisso na vida era comigo mesmo, e não com uma meta de se atingir um paraíso post mortem. Aos dezoito anos quase completados àquela altura, me desdobri com muito pouca bagagem e experiência de vida. Mas ainda havia tempo para recuperação. E desde então posso afirmar com todas as letras que vivi os anos mais prolíficos e intensos do meu quarto de século de vida a ser completado em setembro.
Não sei se as entidades ficcionais existem em algum universo paralelo ou algo do tipo, mas de toda forma agradeço a Lobo Larsen por ter contribuído para que tudo isso acontecesse. E a Jack London, que foi um escritor brilhante, viveu dezenas de vidas em apenas quatro décadas e resumiu sua filosofia de vida na seguinte frase: "prefiro ser um meteoro, todo átomo em magnífica explosão, que um planeta eternamente adormecido".
O romance é narrado em primeira pessoa por Humphrey Van Weyden, um dândi californiano de finais do século XIX, que sobrevive ao naufrágio do ferry boat no qual viajava e é resgatado por uma escuna foqueira chamada Ghost, capitaneada por Lobo Larsen, um homem que desconhece qualquer compromisso que não seja consigo mesmo, um lúcifer miltoniano, como o narrador o descreveria mais tarde. Van Weyden está cheio de concepções grandiloquentes e edificantes sobre o mundo e o homem, e vê todas elas serem esmagadas pela sua própria experiência como prisioneiro semi-escravizado, pelos fatos que presencia na embarcação e nas conversas com Lobo Larsen, que se revela, surpreendentemente, um homem culto e inteligente, o que o torna ainda mais malévolo e ao mesmo tempo intrigante aos olhos de Humphrey.
Lobo Larsen destrói com elegância e objetividade qualquer veleidade de grandeza sentimental ou moral. Não pude resistir a várias leituras, e cada vez que chegava à última página ele me convencia mais e mais de que um mundo tão selvagem e injusto não pode existir um Deus benevolente que queira o bem de todos e possa intervir no transcurso dos acontecimentos. Se Deus quer e pode acabar com o sofrimento, por que então o sofrimento existe? Se ele quer e não pode, então não pode interferir em qualquer evento. Se pode, mas não quer, trata-se de uma divindade malévola. E se nem pode, nem quer, por que diabos chamá-lo de Deus?
Em meados de 2001, sete meses após a primeira leitura, admiti que era um descrente. E sabia que devia creditar a Lobo Larsen o papel de fator desencadeador de toda essa que foi, de longe, a mudança mais substancial da minha vida. Deixei de me torturar e me preocupar com o que um ser onipotente e oniperfeito estaria pensando de mim. Pela primeira vez na vida me sentia completamente livre: meu principal compromisso na vida era comigo mesmo, e não com uma meta de se atingir um paraíso post mortem. Aos dezoito anos quase completados àquela altura, me desdobri com muito pouca bagagem e experiência de vida. Mas ainda havia tempo para recuperação. E desde então posso afirmar com todas as letras que vivi os anos mais prolíficos e intensos do meu quarto de século de vida a ser completado em setembro.
Não sei se as entidades ficcionais existem em algum universo paralelo ou algo do tipo, mas de toda forma agradeço a Lobo Larsen por ter contribuído para que tudo isso acontecesse. E a Jack London, que foi um escritor brilhante, viveu dezenas de vidas em apenas quatro décadas e resumiu sua filosofia de vida na seguinte frase: "prefiro ser um meteoro, todo átomo em magnífica explosão, que um planeta eternamente adormecido".
Marcadores: literatura
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