domingo, junho 12, 2005

O que eu tenho a ver?


Há uma coisa que nunca consegui entender em debates políticos: por que se discute neles acerca de conflitos étnicos/ nacionalistas / religiosos? O que pode bem ser visto na questão Israel x Palestina é a contaminação ideológica em um conflito que nada, mas nada mesmo, tem de ideológico. E quem começou com essa história toda? Como sempre, a esquerda. Ao tomar o antiamericanismo como bandeira, passou a dar pitaco em tudo que os Estados Unidos fizessem, ainda que não tivesse nada a ver com o conflito ideológico entre direita x esquerda. A partir de então, passaram a tomar a causa palestina como bandeira.

O que a causa palestina tem a ver com direita x esquerda? Nada vezes coisa nenhuma. Fatah, Hamas, Jihad Islâmica, Hezbollah, Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa... Nenhum desses movimentos jamais demonstrou seguir um programa esquerdista. Aliás, à exceção da Fatah, nunca seguiram programa nenhum, pois sequer são movimentos políticos, mas sim milícias de guerra, que primeiro querem o poder para depois decidirem o que fazer com ele. A própria Fatah de Arafat apenas assumiu uma faceta política pela necessidade de gerenciar a nesga de poder que ganhou com os Acordos de Oslo, e nunca demonstrou seguir uma linha politicamente definida. Podemos até dizer que nunca tivemos a oportunidade de ver o projeto político de agremiações palestinas, uma vez que jamais tiveram a chance de exercer poder no sentido lato do termo. A causa palestina virou bandeira da esquerda por pura birra com os americanos. Apoiassem eles o lado palestino, os canhotos migrariam em massa para o lado de Israel e considerariam Ariel Sharon um oprimido pelo imperialismo árabe-estadunidense.

E como a direita reagiu a essa politização do impolitizável? Da pior maneira possível: assumindo a defesa por muitas vezes intransigente de Israel. Ou seja, comprando a farsa vendida pela esquerda de que a questão da Terra Santa tem alguma coisa a ver com política. E com isso, todo aquele que se diga de direita ou de esquerda é obrigado a opinar a respeito do conflito Israel x Palestina, como se ele tivesse alguma coisa a ver com política.

A prova de que não tem nada a ver com política é que os outros conflitos étnicos/ territoriais com nuances religiosas não merecem a atenção de direitistas e esquerdistas. O que você pensa sobre o conflito de hutus e tutsis na África Central? Sobre os conflitos entre animistas, cristãos e muçulmanos no Sudão? Sobre os movimentos separatistas de republiquetas russas? Sobre a independência da Transnístria? Sobre a Caxemira? Sobre as dezenas de conflitos étnicos e religiosos da África? Sobre o separatismo de Mindanao, nas Filipinas? Sobre as aspirações do movimento Tâmil, em Sri Lanka?

Todos esses conflitos são idênticos ao israelense-palestino. São étnicos, territoriais e religiosos. Pouco, ou nada, têm a ver com política, a não ser o fato de envolver esta ou aquela potência. Cada qual tem nuances próprias e devem ter soluções próprias. O que eu penso sobre o conflito entre judeus e palestinos nada tem a ver com minhas convicções políticas, e quem quer que as envolva no julgamento de questões como essas demonstra desconhecimento ou má-vontade. Ser a favor da Palestina para birrar com a direita ou a favor de Israel para birrar com a esquerda é mais do que burrice, é inutilidade. Pessoas assim precisam estudar história recente e verificar que os conflitos ideológicos caíram de moda. Com o fim do conflito em Angola, a guerrilha colombiana é o último conflito político-ideológico que restou no mundo. Sobre ele faz sentido pensar em termos políticos. Sobre os outros, não têm nada a ver com minhas convicções políticas e não me afetam de nenhum modo. Estou me lixando para eles.


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