Conclusão que parecia original quando você tirou e que depois percebe ser apenas o resumo daquilo que você já sabia há muito tempo
Os mais pragmáticos acusam a literatura de não produzir nenhum bem palpável, o que a equipararia com a religião no papel de estelionatária das fraquezas humanas. E eles têm razão: a prosa, a poesia, o teatro, bem como a crítica literária como um todo não produzem nenhum bem fisicamente consumível. Mais de quatro mil gerações de seres humanos viveram antes da escrita ser inventada, e pouco mais de vinte viveram desde que Gutenberg imprimiu suas Bíblias e tornou o livro um produto barato e acessível. A rigor não precisamos de literatura para viver, tampouco para aumentar nosso conforto material.
Somos as prostitutas do intelecto humano. Do mesmo jeito que a profissão mais antiga do mundo vende prazer sexual para corpos carentes, nós que escrevemos e fazemos crítica literária (ainda que não profissionalmente, que fique bem dito), vendemos prazer psicológico para intelectos curiosos. Não nego as funções secundárias, mas não menos importantes, da literatura de ser o retrato de um povo ou uma época, e notadamente nos escritos de mitologia antiga, guardiã mesmo da história de um povo ou de uma civilização inteira. Ou o romance dos últimos duzentos anos, que tem incessantemente buscado ser uma imagem e uma crítica do mundo moderno, este ente em constante construção e crise de identidade saído das fornalhas das indústrias e dos vapores dos motores da Revolução Industrial, um Prometeu desacorrentado, na felicíssima analogia empregada por David Landes.
Independente de tudo isso, como falava, não estamos um degrau sequer acima das prostitutas na hierarquia econômica. Nós e elas mercadejamos prazeres, de natureza distinta, mas irmanados na sua condição de meros deleites. Autores vendem deleites intelectuais, críticos ajudam os clientes-leitores a usufruir melhor tais deleites. Desempenham, ainda que com ressalvas, o papel de cafetões da literatura.
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